Brasil e Índia anunciam 15 acordos bilaterais

Chamando repetidamente o presidente Jair Bolsonaro de “meu amigo”, o primeiro-ministro indiano, Narendra Modi, ressaltou que Índia e Brasil têm “ideologia e valores comuns”, e anunciou a assinatura de 15 acordos bilaterais – segundo o líder brasileiro, um recorde.

“Numa viagem internacional, não tínhamos notícia de tantos acordos, e bons acordos, serem assinados”, discursou Bolsonaro após encontro bilateral com Modi, no segundo dia de sua visita oficial à Índia.

Ele agradeceu pelo “carinho” da recepção: “Ainda faltam dois dias para eu ir embora da Índia e já estou sentindo saudades”.

Bolsonaro e Modi são alinhados ideologicamente – nacionalistas de direita – e criticados na mídia internacional.

“A parceria estratégica entre Índia e Brasil se baseia em nossa ideologia e valores comuns, apesar da distância geográfica”, disse Modi. “Sendo duas grandes democracias e países em desenvolvimento, há uma profunda semelhança entre as visões de Índia e Brasil sobre importantes questões globais e multilaterais, entre elas o grave problema do terrorismo e a questão do meio ambiente. Nossa perspectiva sobre os atuais desafios que o mundo enfrenta é muito semelhante.”

O principal acordo assinado é o de cooperação e facilitação de investimentos (ACFI), cujo objetivo é dar mais segurança jurídica e incentivar investimentos. O investidor estrangeiro passará a ter um “ombudsman” na Camex (Câmara do Comércio Exterior), a quem pode recorrer para prevenir conflitos ou mediar disputas.

O investidor brasileiro também terá um mecanismo semelhante na Índia. O tratado segue um novo modelo que exclui a cláusula investidor-Estado, que previa que os Estados poderiam ser acionados em arbitragem internacional pelas empresas investidoras.

O Brasil já assinou acordos nesse modelo com Angola, Chi- le, Colômbia, Emirados Árabes Unidos, México, Moçambique e Peru, entre outros.

Hoje, há US$ 6 bilhões (R$ 25 bilhões) em investimentos indianos no Brasil, e apenas US$ 1 bilhão (R$ 4,2 bilhões) de aportes brasileiros na Índia, segundo o governo indiano.

Também foram anunciados dois acordos que são demandas antigas do setor privado brasileiro. Um é o de Previdência, que permite aos executivos que o tempo em que trabalham expatriados seja contado para sua aposentadoria, que elimina a dupla contribuição previdenciária.

O outro é uma revisão do acordo de eliminação de bitributação Brasil-Índia, válido desde 1992, que deve ter suas alíquotas atualizadas.

Também foi celebrado memorando de entendimento sobre cooperação de bioenergia, que tem como objetivo aumentar a produção e uso do etanol no mercado indiano, o que pode aliviar as distorções causadas pelos subsídios do governo da Índia ao açúcar.

A ideia é que mais países passem a produzir etanol, para que o produto se torne uma commodity, ampliando o mercado, ao mesmo tempo em que reduz a grande produção indiana de açúcar, que distorce preços internacionais.

O Brasil, Austrália e Guatemala pediram abertura de painel (investigação) na OMC (Organização Mundial do Comércio) questionando os subsídios do governo indiano aos produtores de açúcar.

Modi teria pedido a Bolsonaro que revisse o contencioso. O brasileiro disse que pediu ao chanceler Ernesto Araújo que verifique a possibilidade de o Brasil rever sua posição – o que é difícil de ocorrer, segundo a Folha apurou.

Modi também abordou a possibilidade de produção de carros flex na Índia, o que abriria um grande mercado para tecnologia brasileira. O governo indiano passará a exigir uma mistura de 10% de etanol nos combustíveis a partir de 2022 e 20% a partir de 2030.

Também foram assinados acordos para cooperação em investigações criminais, intercâmbio cultural, exploração de óelo e gás, de recursos minerais, segurança cibernética, intercâmbio de material genético de gado leiteiro, medicina ayurvédica e homeopatia, além de parceria entre a Apex (agência de promoção) e a Invest-India.

Os indianos pressionaram até o último minuto para que Bolsonaro anunciasse a isenção de vistos para cidadãos do país entrarem no Brasil, mas, como antecipou a Folha, o anúncio acabou não saindo, apesar das promessas feitas na China e na cúpula dos Brics.

Embora Bolsonaro tenha anunciado no Twitter que o comércio com a Índia poderá passar a US$ 50 bilhões até 2022, creditando o número a Modi, a declaração oficial da visita fala apenas em “meta realista de US$ 15 bilhões”.

Em 2019, o fluxo de comércio entre os dois países foi de US$ 7 bilhões, ou seja, teria de aumentar sete vezes para chegar à estimativa de Bolsonaro.

Segundo uma fonte, o valor de US$ 50 bilhões foi mencionado nas conversas das autoridades indianas e de Modi com Bolsonaro, mas referia-se a vários anos, e não a 2022.