Futebol defensivo torna Campeonato Brasileiro campeão de resultados 1 a 0

Comparado às principais ligas do mundo, o Campeonato Brasileiro é o campeão do 1 a 0. Segundo levantamento realizado pela reportagem, na edição de 2018 cerca de um quarto dos jogos da competição terminou com vitória pelo placar mínimo. Uma fatia maior que a dos campeonatos nacionais de Alemanha, Argentina, Espanha, França, Inglaterra, Itália e México.

A porcentagem de 25,3% de resultados 1 a 0 é inferior às das edições de 2014 (26,8%) e de 2016 (26,9%), mas a evolução desde 2012 mostra uma tendência de crescimento.

Nesse período, só em dois anos o Brasileiro ficou atrás de outras ligas no número de jogos 1 a 0. Em 2012, quando a França teve porção maior (21,1% a 19,2%), e em 2017, quando a Argentina ficou com a liderança (24,3% a 23,7%).

Para Carlos Alberto Parreira, 76, analista da Fifa na Copa do Mundo da Rússia, em 2018, e treinador da seleção brasileira campeã mundial em 1994, o predomínio de vitórias simples pode ser atribuído, em parte, ao estilo de jogo das equipes brasileiras.

“Os times são mais reativos do que pró-ativos, ou seja, preferem não tomar um gol e jogar por uma bola”, diz.

“Isso não é uma crítica, porque tem equipes que fazem muito bem esse papel de se defender e aproveitar uma jogada ou duas e garantir o resultado e até o título”, completa.

De acordo com o ex-treinador, no futebol europeu o jogo flui mais que no Brasil, com times que conseguem fazer  transição defensiva e ofensiva mais rápida. Como exemplo, ele cita o Ajax (HOL), que eliminou a Juventus nas quartas de final da Champions League e disputará o primeiro jogo da semifinal contra o Tottenham na próxima terça-feira (30).

“No Brasil, o jogo é muito truncado. Para muito. Os jogadores caem muito, reclamam toda hora do árbitro. Não tem uma sequência e isso tem me irritado muito”, acrescenta.

Parreira, que ainda tem no seu currículo a participação em outros cinco Mundiais (1982, 1990, 1998, 2006 e 2010), além de exercer o cargo de coordenador técnico da seleção em 2014, cita outros fatores para o excesso de 1 a 0, como a saída precoce de revelações, que em geral jogam no ataque, diminuindo assim a qualidade dos jogadores que atuam no futebol brasileiro.

Tetracampeão nacional (2006, 2007 e 2008 com o São Paulo e 2010 pelo Fluminense) e hoje comentarista da Rede Globo, o ex-treinador Muricy Ramalho, 63, concorda que a falta de jogadores com qualidades ofensivas influencia no excesso de placares 1 a 0.

“No Brasil, está se fazendo a coisa que é mais fácil: se defender. O técnico tem uma influência grande na parte defensiva. Na parte ofensiva, depende muito mais do jogador do que do técnico”, diz Muricy.

“Aí entra a qualidade do atleta, e estamos sem esses jogadores que podem improvisar no mercado. Os nossos principais destaques ofensivos estão fora do país”, afirma.

Ele ainda credita a opção pelo futebol mais defensivo à falta de estabilidade dos técnicos brasileiros, que acabam ficando inseguros e optando pelo caminho mais fácil.

Demitido do Atlético-MG no último dia 11, Levir Culpi, 66, concorda que a pressão por resultados faz com que muitos técnicos tenham aversão ao risco e prefiram fechar o time após marcar o primeiro gol.

“Os nossos treinadores não têm segurança porque os dirigentes não têm convicção da escolha que fizeram na contratação. Se você não dá segurança para os técnicos, principalmente para os mais jovens, eles vão jogar fechados, vão jogar por uma bola. Eles se agarram nisso porque só fica quem ganha”, afirma Muricy.

Já para Renato Gaúcho, treinador do Grêmio, apontado como um dos melhores times do Brasil, falta ambição aos companheiros de profissão.

“Sempre jogamos para ganhar e fazer gols. Na minha opinião, o maior respeito que podemos mostrar pelo rival é buscar o gol a todo instante. Mas para isso é preciso ter as peças certas. O Grêmio me dá essa possibilidade. Temos um grupo muito qualificado e que gosta de buscar o gol”, diz.

Por outro lado, o time gaúcho é o que mais colaborou para a predominância do 1 a 0 no Brasileiro nos últimos anos, com 49 vitórias pelo placar mínimo desde 2012. No ano passado, 7 de suas 18 vitórias (38,8%) foram dessa forma.

O São Paulo, que teve dois treinadores durante o Campeonato Brasileiro de 2018 -Diego Aguirre e André Jardine-, conseguiu metade de seus 16 triunfos pelo placar mínimo. Mesmo índice de Fluminense e Ceará. Rebaixado para a Série B no ano passado, o Vitória obteve sete de suas nove vitórias no torneio por 1 a 0.

Apesar das críticas ao futebol defensivo, há quem veja na proeminência de vitórias por 1 a 0 uma indicação positiva.

Para Dorival Júnior, 56, vice-campeão brasileiro no ano passado com o Flamengo, o grande número de jogos que terminam em 1 a 0 é consequência do equilíbrio.

“No Espanhol, por exemplo, você pode cravar que o Barcelona e o Real Madrid vão estar nas três primeiras posições. No Brasileiro, tem 12 equipes que podem brigar pelo título, diz o treinador, que assumiu o time rubro-negro no final de setembro e obteve 2 das 7 vitórias pelo placar mínimo.

“É natural que os resultados com número alto de gols sejam mais raros. É reflexo do equilíbrio. Quando falamos em equilíbrio não falamos de qualidade maior ou menor”, finaliza.