Burocracia atrasa envio de brigadistas para combater incêndios no Pantanal e na Amazônia

Relatórios do Ibama mostram que a burocracia e a falta de planejamento atrasaram a contratação de brigadistas para combater os incêndios na Amazônia e no Pantanal.

O Globo teve acesso a uma série de relatórios internos do órgão do Ministério do Meio Ambiente, mostrando que mudanças na lei e uma série de registros burocráticos contribuíram para o atraso dos brigadistas. A demora para o envio dos servidores inviabilizou a proteção de territórios indígenas e também expôs localidades do Cerrado.

A reportagem diz que “a autorização para a viagem dos brigadistas recebeu o aval do Ministério da Economia (ME) apenas em junho, dois meses após o assunto chegar à pasta. Foi aprovado o envio de 1.481 profissionais para as áreas de queimadas”.

Ao Globo, o Ministério da Economia informou que o Ministério do Meio Ambiente “não apresentou uma série de documentos obrigatórios, conforme determina o regulamento para solicitação de contratação temporária”.

O Ministério do Meio Ambiente contava com os brigadistas que trabalharam em 2019, mas uma medida provisória publicada em março de 2020 proibiu a recontratação de pessoal com menos de dois anos do encerramento do último contrato, o que contribuiu para o atraso. O Jornal Nacional também teve acesso aos documentos.

Em maio, o então chefe do Prevfogo, Centro Nacional de Prevenção e Combate aos Incêndios Florestais do Ibama, Gabriel Zacharias, que foi demitido em setembro, alertou que “a contratação dos brigadistas, para as atividades de prevenção são necessárias a partir do mês de abril em partes da região central do Brasil, em especial Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Tocantins, Goiás e Distrito Federal. Para o restante do país, as atividades de prevenção e mitigação do problema dos incêndios devem se iniciar no mês de maio”.

Mesmo com o atraso, ele reforçou que ainda precisava dos brigadistas: “Para o ano corrente, devido aos trâmites orçamentários e administrativos necessários, não fora possível a contratação desde a data inicialmente prevista o que, não quer dizer, que a contratação não seja mais necessária. O início das atividades em junho ainda permitirá algum tipo de atividade preventiva, respeitando também as regras impostas pela pandemia de Covid-19, além de ter equipes em campo aptas a realizarem os combates aos incêndios que se iniciarem, impedindo que esses ganhem grandes proporções.”

Em junho, uma portaria dos Ministérios da Economia e do Meio Ambiente autorizou a contratação dos brigadistas. Apesar do alerta de que precisava dos profissionais desde abril, o Centro de Prevenção e Combate aos Incêndios Florestais teve que esperar até agosto o Ibama dar a autorização definitiva para contratar os brigadistas.

“Tudo que é feito em cima da hora para atender uma emergência, ela não tem condição de sair de uma forma eficiente. Se nós não tivermos a combinação de um planejamento com antecedência, abastecido com informações, sejam aquelas que o Inpe vem dando, sejam aquelas que a academia vem dando e montemos um processo de combate inteligente e que vá na raiz da questão, nós vamos assistir todo ano queimadas descontroladas e as pessoas e o governo correndo atrás do prejuízo”, diz Paulo Moutinho, pesquisador do Ipam.

O Inpe, Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais, registrou 76 mil focos de queimadas na Amazônia entre janeiro e setembro de 2020. Só em setembro foram 32 mil focos – um aumento de 60% em relação a 2019.

No Pantanal, foram 18 mil focos de queimadas em 2020. Em 2019, foram seis mil.

O ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, criticado pelo desmonte dos órgãos ambientais, esteve na Chapada dos Veadeiros em Goiás acompanhando o combate às queimadas nesta sexta (9) e sábado (10). O governo publicou um vídeo em uma rede social em que o ministro diz que aviões estão despejando água misturada com um retardante, que, segundo o ministro, potencializa em cinco vezes a capacidade de resposta no combate ao fogo.

Moradores da região protestaram com placas nos muros pedindo a saída do ministro. Eles criticam o uso do retardante.

“O ministro não pode autorizar o despejo de um pó retardante que pode causar perdas para a biodiversidade, sofrimento para a nossa fauna e enfraquecer nosso solo. Fora o risco de infecções pulmonares, já que os brigadistas não contam com EPIs para esse tipo de combate químico”, disse uma moradora que preferiu não ser identificada.

Em nota, a Secretaria de Meio Ambiente de Goiás informou que não há nenhuma regulamentação sobre o referido produto químico; que não foi consultada sobre sua utilização e que não é autorizado o uso do mesmo dentro da área de proteção ambiental do Pouso Alto.

O Ministério do Meio Ambiente declarou que o Parque Nacional da Chapada dos Veadeiros é de jurisdição federal e que qualquer decisão sobre o uso ou não de retardante para combater os incêndios compete ao ICMBio.

Os Ministérios do Meio Ambiente e da Economia não responderam sobre a demora para a contratação dos brigadistas.

G1